Mecânica dos fluidos/Fluxo laminar do líquido Newtoniano

Fonte: testwiki
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Quando o fluido não pode ser aproximado pelo modelo do fluido ideal, e sim pelo modelo do líquido Newtoniano, devem ser usadas as as equações de Navier-Stokes. Em algumas situações onde a geometria do problema é simples e o fluxo é laminar, existe uma solução analítica para essas equações. O fluxo laminar é caracterizado pela sua espessura h0.

Fluxo plenamente desenvolvido entre duas placas planas

A configuração geométrica mais simples possível de um escoamento ocorre quando o líquido flui entre duas placas paralelas infinitas. Por exemplo, em muitas situações práticas, óleo lubrificante flui por um intervalo entre um cilindro e um pistão; como o intervalo de escoamento é muito pequeno, com relação às demais dimensões, o problema pode ser modelado como um fluxo entre duas placas planas infinitas. Nesses casos, h0 é a espessura do intervalo. A escolha natural é o eixo X na direção do fluxo e o eixo Z na vertical. Como sabemos, a velocidade é nula nas paredes. Assim,


vx(0)=vx(h0)=0


Além disso, como o escoamento está plenamente desenvolvido,


vxx=0


e, por simetria,


vxy=0


vy=vz=0


Além disso, o escoamento está em regime estacionário, ou seja, nenhuma propriedade varia no tempo


ηt=0


A equação da continuidade, nessas condições, se torna


v=0vxx+vyy+vzz=0vxx+0+0=0


A equação de Navier-Stokes referente ao eixo X simplifica-se para


px+μ0(2vxx2+2vxy2+2vxz2)+ρ0gx=ρ0(vxvxx+vyvxy+vzvxz+vxt)


px+μ0(0+0+2vxz2)+0=ρ0(0+0+0+0)


μ02vxz2=px


Na igualdade acima, o lado esquerdo é uma função de z, somente, e o lado direito, uma função somente de x. Para que isso seja verdadeiro para todo x e z, é preciso que ambos sejam iguais a uma constante. Assim


μ02vxz2=k1μ0vxz=k1z+k2μ0vx=k12z2+k2z+k3


vx(0)=0k3=0


vx(h0)=0k12h02+k2h0=0k2=k1h02


Assim


vx=12μ0px(z2h0z)


As equações para os demais eixos simplificam-se da seguinte forma:


pz+μ0(2vzx2+2vzy2+2vzz2)+ρ0gz=ρ0(vxvzx+vyvzy+vzvzz+vzt)


pz+μ0(0+0+0)+0=ρ0(0+0+0+0)


pz=ρ0gp=ρgz+k4


py+μ0(2vyx2+2vyy2+2vyz2)=ρ0(vyvxx+vyvyy+vzvyz+vxt)


0+μ0(0+0+0)=ρ0(0+0+0+0)


As equações de Navier-Stokes, uma vez resolvidas, nos informam que:

  1. a pressão varia de forma hidrostática no sentido do eixo Z;
  2. a pressão varia de forma contínua no sentido do eixo X;
  3. o perfil de velocidades ao longo do eixo Z assume a forma de uma parábola;

A variação da pressão ao longo do eixo X se dá porque a viscosidade do fluido provoca uma perda de carga devido ao atrito com as paredes. Curiosamente, a variação da velocidade ao longo desse eixo não faz com que a pressão varie de forma similar; a variação de pressão nesse sentido deve-se apenas ao efeito da gravidade. É a variação da velocidade ao longo do eixo Z que está relacionada com a variação da pressão ao longo do eixo X.

Uma vez obtidas as velocidades, podemos calcular as tensões a partir das relações


τxy=μ0vyx=0


τxz=μ0vzx=0


τyx=μ0vxy=0


τyz=μ0vzy=0


τzx=μ0vxz=μ0z(12μ0px(z2h0z))=12px(2zh0)


τzy=μ0vyz=0


As equações acima mostram que só estão presentes tensões no sentido do eixo X, devidas à pressão exercida no eixo Z. A tensão é nula no centro do fluxo, onde z=h02. Nesse ponto, a velocidade é máxima


vx(h02)=12μ0px((h02)2h0h02)=h028μ0px


A velocidade é positiva, porque px é negativa (a pressão vai diminuindo no sentido do fluxo).


A vazão é dada por


Φ=AvxdA=Avxdzdy=W0h0vxdz


onde W é a largura das placas. Assim,


Φ=W0h012μ0px(z2h0z)dz=W2μ0px(z33h0z22)|0h0


Φ=W2μ0px(h033h032)=Wh0312μ0px


A vazão é positiva, porque px é negativa. A velocidade média será


v¯x=ΦA=Wh0312μ0pxWh0=h0212μ0px


que também é positiva. Verifica-se, assim, que a velocidade máxima é 50% superior à velocidade média.

De acordo com resultados experimentais, nesse tipo de problema, o escoamento se mantém laminar somente até valores muito limitados do número de Reynolds (tipicamente, 1400). O valor constante de px pode ser obtido facilmente medindo-se a perda de carga ao longo de um trecho de comprimento L e fazendo px=ΔpL

Fluxo livre em um plano inclinado

A expressão fluxo livre significa que a única ação externa a que o fluido está sujeito é aquela devida ao seu próprio peso. A melhor escolha do eixo X é na direção do fluxo, ou seja, paralelo ao plano, com o eixo Z perpendicular a este e apontando para baixo. O eixo Y, em consequência, ficará também paralelo ao plano. Considerando-se um plano de inclinação Θ, esse peso terá componentes no eixo X e no eixo Z, mas não no eixo Y; chamemos gx e gz essas componentes. A hipótese de fluxo laminar implica, obviamente, em vz = vy = 0. Finalmente, devido à simetria, para uma propriedade η qualquer,


ηy=0


Neste caso, a equação de continuidade nos dá


v=0vxx+vyy+vzz=0vxx+0+0=0


A equação de Navier-Stokes referente ao eixo X, neste caso, simplifica-se para


px+μ0(2vxx2+2vxy2+2vxz2)+ρ0gx=ρ0(vxvxx+vyvxy+vzvxz+vxt)


0+μ0(0+0+2vxz2)+ρ0gsinθ=ρ0(0+0+0+0)μ02vxz2=ρ0gsinθ


A variação da pressão ao longo do eixo X é nula, porque o líquido tem uma superfície livre e, portanto, à pressão atmosférica. Em outras palavras, p(x,y,0) = constante para todos os valores de x e de y.

Similarmente, para o eixo Y


py+μ0(2vyx2+2vyy2+2vyz2)=ρ0(vyvxx+vyvyy+vzvyz+vxt)


0+μ0(0+0+0)=ρ0(0+0+0+0)


E, para o eixo Z


pz+μ0(2vzx2+2vzy2+2vzz2)+ρ0gz=ρ0(vxvzx+vyvzy+vzvzz+vzt)


pz+μ0(0+0+0)+ρ0gcosθ=ρ0(0+0+0+0)pz=ρ0gcosθ


Integrando a primeira equação, teremos


μ02vxz2=ρ0gsinθvx=ρ0gsinθ2μ0z2+k1z+k2


Mas não pode haver fluxo em z = 0 (adjacente ao plano), nem tensões em z = - h0 (superfície do fluido), portanto


vx(0)=0k2=0


vxz(h0)=0ρ0gsinθμ0h0+k1=0


Portanto


vx=ρ0gsinθμ0(z22+h0z)


A equação que descreve o campo de tensões é, então, a seguinte


τzx=μ0vxz=ρ0gsinθ(z+h0)


A tensão nos pontos ajdacentes ao plano inclinado será


τzx(0)=ρ0gsinθ(0+h0)=ρ0gh0sinθ


o valor negativo indicando que ela aponta na direção negativa do eixo X, ou seja, é contrária ao fluxo. A vazão volumétrica será


Φ=Axvxdzdy=Wh00ρ0gsinθμ0(z22+h0z)dz


onde W é a largura do plano. Assim,


Φ=ρ0gWsinθμ0h00(z22+h0z)dz=ρ0gWsinθμ0(z36+h0z22)|0h0


Φ=ρ0gWsinθμ0(h036+h032)=ρ0gWh03sinθ3μ0


Podemos calcular também a velocidade média


v¯x=ΦAx=ρ0gWh03sinθ3μ0Wh0=ρ0gh02sinθ3μ0


Quanto à segunda equação


pz=ρ0gcosθ


Ela nos fornece informação a respeito do campo de pressões, informação esta que coincide com aquela derivável da análise estática.

Fluxo livre entre dois cilindros concêntricos girantes

Consideremos agora dois cilindros verticais concêntricos, com o cilindro exterior girando a uma velocidade constante ω0 e com um fluido Newtoniano no espaço entre eles. Dessa maneira, o fluido se movimenta em relação ao cilindro exterior. Chamemos R ao raio do cilindro interior e R + h0 ao raio do cilindro exterior. A geometria do problema pede o uso de coordenadas colindricas; para que o eixo Z aponte para baixo, a regra da mão direita exige que o ângulo Θ seja medido no sentido horário. Suponhamos que o giro do cilindro maior esteja nesse mesmo sentido, o que fará com que ω0 seja positiva.

Como vimos anteriormente, as equações básicas em coordenadas cilíndricas são as seguintes:


1rr(rvr)+1rθ(vθ)+z(vz)=0


ρ0(vrt+vrvrr+vθrvrθvθ2r+vrvrz)=


=ρ0grpr+μ0[r(1rr(rvr))+1r22vrθ22r2vθθ+2vrz2]


ρ0(vθt+vrvθr+vθrvθθ+vrvθr+vrvθz)=


=ρ0gθ1rpθ+μ0[r(1rr(rvθ))+1r22vθθ2+2r2vθθ+2vθz2]


ρ0(vzt+vrvzr+vθrvzθ+vzvzz)=


=ρ0gzpz+μ0[1rr(rvzr)+1r22vzθ2+2vzz2]


A geometria do problema implica em


gr=gθ=0gz=gηθ=0


para qualquer propriedade η. O movimento é unidimensional, portanto vr = vz = 0. Como vΘ = f(r), teremos


vθt=vθθ=vθz=0


Assim, as equações se simplificam para


0+1rθ(vθ)+0=0


ρ0(0+0+0vθ2r+0)=0pr+μ0[0+00+0]ρ0vθ2r=pr


ρ0(0+0+0+0+0)=00+μ0[r(1rr(rvθ))+0+0+0]0=r(1rr(rvθ))


ρ0(0+0+0+0)=ρgpz+μ0[0+0+0]ρg=pz


Novamente, a última equação traz informação a respeito da variação de pressão que coincide com a proporcionada pela análise estática. A equação de continuidade nos diz simplesmente que a velocidade deve ser constante ao longo do fluxo. Resolvendo a segunda equação:


1rddr(rvθ)=k1ddr(rvθ)=k1r(rvθ)=k12r2+k2


vθ=k12r+k2r


No ponto adjacente ao cilindro menor (r = R), vΘ = 0, portanto


0=k12R+k2Rk2=k12R2


No ponto adjacente ao cilindro maior (r = R + h0), vΘ = ω0r , portanto


ω0(R+h0)=k12(R+h0)+k2R+h0ω0=k12k12R21(R+h0)2


k1=2ω01(RR+h0)2


E assim


k2=k12R2=ω0R21(RR+h0)2


Logo, a expressão para a velocidade vΘ é a seguinte:


vθ=ω01(RR+h0)2rω0R21(RR+h0)21r=ω01(RR+h0)2(rR2r)


A partir dessa expressão, podemos encontrar o valor da tensão cisalhante τ


τrθ=μ0[rr(vθr)+1rvrθ]=μ0[rr(k12+k2r2)+0]


τrθ=μ0[r(2k2r3)]=2μ0k2r2=2μ0ω0R21(RR+h0)21r2


o valor positivo indicando uma tensão na direção do movimento (o cilindro externo arrasta o fluido). Sabemos que a tensão será máxima quando r = R (velocidade nula)


τrθ(R)=2μ0ω0R21(RR+h0)21R2=2μ0ω01(RR+h0)2

Exercícios resolvidos



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